7 de abr. de 2012

GREVE

“Greve, greve, greve!”. O coro tomou conta da Praça do Patriarca, no Centro da capital paulista, na tarde desta quarta-feira, 4, interrompendo a fala da professora Lourdes Quadros, que defendia a continuidade do movimento. “Com essa contraproposta não dá. O governo Kassab não garante o direito de férias, não fez uma proposta real sobre os nosso salários... Temos de continuar parados”, defendeu. A votação foi esmagadora, com mais de 90% dos cerca de 10 mil profissionais a favor da continuidade. Em seguida, os educadores iniciaram uma passeata até a Câmara Municipal, para pressionar os vereadores a aprovar o projeto de lei sobre o reajuste da categoria. A votação na assembleia reflete o ânimo dos profissionais da educação municipal, parados desde a segunda, 2, em um forte movimento. Ainda que a prefeitura de Gilberto Kassab (PSD) insista em dizer que apenas 10% das escolas estão paralisadas, o sindicato da categoria, o SINPEEM, contabiliza entre 60% a 65% das escolas, de todos os níveis, com algum nível de paralisação. Nesta quarta, segundo professores ligados à CSP-Conlutas, este nível pode ter alcançado até 90% das 1.434 unidades, por conta da assembleia e do ato previstos para hoje. Entre as reivindicações dos profissionais de educação, há duas exigências fundamentais. Uma delas é sobre o reajuste salarial. No ano passado, repetindo o que foi feito por Alckmin na educação estadual, a prefeitura conseguiu “escalonar” o reajuste da categoria, definindo um índice prévio para os anos seguintes. Os profissionais agora sentem o efeito deste ataque, com os salários corroídos pela inflação, e exigem a antecipação imediata do índice de reajuste previstos para 2013 e 2014. O governo não acenou com isso, oferecendo apenas a antecipação de parcelas de um bônus que seria pago no fim do ano, o PDE. A assembleia não aceitou. A outra reivindicação é a garantia do recesso de julho e dezembro e das férias coletivas de janeiro de 30 dias aos profissionais de ensino dos Centros de Educação Infantil (CEIs) e demais modalidades de ensino. A Justiça paulista decidiu que as creches e pré-escolas não poderiam ficar fechadas durante as férias e o recesso de julho, atendendo as crianças. Enquanto isso, hoje são mais de 300 mil crianças sem vagas na creche. Os profissionais de educação afirmam que não querem afetar o direito das crianças terem acesso nestes períodos, mas lutam para que a prefeitura não acabe com o seu direito às férias, para cumprir a decisão judicial. “Os governos não se preocupam com a educação. Para eles, as escolas são depósitos de alunos. Por isso que o país só investe 4,5% do PIB em educação, quando seriam necessários ao menos 10%, imediatamente. Nossa greve é pela qualidade de ensino”, afirma Lourdes Quadros. Em São Paulo, os educadores aprovaram ainda um calendário de luta até a próxima assembleia, marcada para a terça-feira, 10, na Praça do Patriarca. Nesta quinta, eles retornam às escolas, para conversas e reuniões com a comunidade escolar, explicando os motivos do movimento. E, nos próximos dias, realizam atos públicos nas regiões e bairros da capital. Além de São Paulo, o Distrito Federal e outras quatro capitais têm a rede municipal paralisada neste momento: Teresina, Belo Horizonte, São Luis e Natal. Além de diversas cidades, como Santa Rita, na Paraíba.

23 de jul. de 2011

HISTÓRIA DO HAITI

O Haiti é o país mais pobre do continente. Dois terços de sua população vive na mais absoluta pobreza. Muitas famílias sobrevivem com menos de um dólar por dia e a expectativa de vida média da população chega a apenas 45 anos. Isto é resultado de brutal pilhagem colonial e imperialista que o país sofreu ao longo de sua história. História que também está marcada por lutas heróicas. A era moderna do Haiti é inaugurada por um genocídio. Em 1492, Cristóvão Colombo descobre a ilha de La Española, hoje em dia dividida entre Haiti, ao ocidente (oeste), e a República Dominicana, ao Oriente (leste). Em menos de meio século, a maioria de seus primitivos habitantes, mais de 300 mil índios taínos, havia sido exterminada, dizimada pela escravidão nas minas de ouro, em massacres e epidemias. A partir de 1505, é introduzido na ilha o cultivo da cana de açúcar. Barcos negreiros trazem escravos africanos para trabalharem no plantio. Na medida em que os colonos espanhóis, frente ao esgotamento das minas de ouro, abandonam a ilha rumo a América do Sul, os franceses ocupam a ilha de Tortuga, no norte do Haiti. Em 1697, a Espanha aceita a soberania francesa nessas terras que, após um século, recebem o nome de Haiti. Graças ao cultivo da cana de açúcar, cuja importância era similar a de petróleo atualmente, o Haiti se converte em uma das colônias mais ricas do mundo. Uma riqueza que se baseava na brutal exploração de mais de 500 mil escravos africanos obrigados a trabalhar de sol a sol em condições desumanas. No momento da Revolução Francesa, a população de escravos é dez vezes maior do que a de brancos e de homens livres, majoritariamente mestiços e negros que obtiveram ou compraram sua liberdade. Quando começaram a chegar os primeiros ecos da Revolução Francesa, em 1789, as aspirações de liberdade se expressam na voz de Toussaint Louverture, o Espartaco Negro. Sua figura domina a história até 1804, quando o Haiti conquista sua independência. Mais de 200 mil pessoas, a maior parte negros, morreram durante aquela revolução. Foi não só a primeira revolução anti-colonial triunfante na América Latina como, também, a primeira revolução vitoriosa de escravos no mundo. Mas a economia haitiana estava em ruínas. As plantações haviam sido devastadas e ressurgiu o antagonismo entre a maioria negra e a minoria mestiça. Temendo um contágio abolicionista, as potências dessa época, que em sua maioria não haviam abolido a escravidão, isolaram e marginalizaram a jovem República negra. A guerra pela independência na América espanhola e uma larga série de guerras civis que sucederam impediram também a unidade de ambos os processos revolucionários. As autoridades haitianas temiam que a França lançasse uma invasão. Paris, buscando recuperar sua antiga colônia, reclama em 1814 uma compensação no valor de 150 milhões de francos em ouro, para indenizar os colonos. Em 1838, a França reconhece a independência do Haiti, sobre a base da aceitação dessa “dívida”, agora reduzida a 90 milhões de francos. Até 1883, o Haiti pagou em partes o total dessa indenização. Em 2003, Aristide lançou uma campanha exigindo da França o reembolso dessa “dívida da independência”, cujo valor atualizado chega a 21,6 milhões de dólares. Obviamente, a França não pagou. Durante o século XIX, o peso dessa dívida nas finanças do Haiti, a devastação das florestas e o empobrecimento do solo causado pela exploração excessiva durante o período colonial afetaram o desenvolvimento da nova República negra. Os choques internos originaram várias guerras civis e até a divisão temporária do país. Isso aprofundou o antagonismo entre as massas de ex-escravos, que sobreviviam nas zonas rurais, e a nova burguesia oligárquica urbana, sobretudo mestiça, que enriqueceu com o comércio de café. Sucederam-se golpes de Estado, motins e golpes palacianos. No século XX mudam os protagonistas, mas não a realidade de pilhagem e miséria. Também vai emergir como potência dominante o imperialismo norte-americano. A partir daí, a América Central e o Caribe são considerados pelos EUA como seu “quintal”. Inicia-se, então, a política do “Big Stick” (grande tacão) para demonstrar quem realmente manda. O verdadeiro significado dessa política fica evidente com a frase de presidente Monroe “América para os americanos”. Começa então uma série de invasões a distintos países da região. O Haiti foi ocupado pelos soldados dos EUA em 1915, que lá permanecem até 1934. Eles tomaram o controle da aduana e criaram exércitos para defender seus interesses. Depois, em 1957, eles irão apoiar a ditadura dos Duvalier, varrida em 1986 por uma imensa rebelião popular. Começa assim a história recente que analisamos no artigo principal dessa edição do Correio Internacional. Atualmente, o domínio ianque da economia haitiana é quase absoluto: 89% das importações e 65% das exportações se realizam com os EUA. Aliado com uma pequena oligarquia mestiça (menos de 5% da população) e branca (pouco mais de 1%), oprimem e exploram a imensa maioria negra. Nas últimas décadas, à tradicional produção de café, rum e tabaco, foram agregadas também indústrias de vestido e de brinquedos para exportação, como as maquiladoras nas chamadas “zonas livres” de Porto Príncipe. Nelas as empresas multinacionais pagam salários de fome e ganham fortunas. Como uma amarga ironia do capitalismo, uma parte destas roupas volta ao Haiti já usada, reingressadas por expressas estrangeiras para vendê-las a preços baixos ou como parte da hipócrita ajuda humanitária do imperialismo. A maioria dos haitianos só usa estas roupas de segunda mão porque não pode comprar uma nova, nem mesmo os que trabalham nas fábricas que as produzem.

Em meio a impasse, Democratas e Republicanos concordam que os mais pobres paguem o preço da crise

O impasse político que se arrasta nos EUA há algumas semanas fez acender o sinal vermelho da economia mundial ao mesmo tempo em que mostra que a crise desatada em 2007 está muito longe de terminar. No centro do imperialismo, a crise econômica se desdobra em uma grave luta política. Em resumo, o governo Obama precisa aumentar o teto do endividamento público, que lá é definido por lei, para continuar pagando as contas, principalmente os serviços da dívida pública. O impasse está nos condicionantes para tal manobra. A fim de autorizar Obama a elevar o endividamento para além dos já inacreditáveis 14 trilhões de dólares, o Partido Republicano exige um rígido programa de cortes fiscais do Estado, atingindo, sobretudo os gastos sociais. Os democratas, por outro lado, a fim de resguardar parte de seu eleitorado, querem que uma pequena parte desse ajuste, ou 20%, venha de aumento de impostos. Ambos, porém, concordam na meta de se reduzir em 4 trilhões de dólares o déficit público nos próximos 10 anos. No entanto, o prazo para a elevação do teto da dívida se encerra no dia 2 de agosto. O governo Obama e grande parte da mídia internacional anunciam o apocalipse caso não se chegue a um acordo até esse dia. A megapotência teria que declarar moratória em parte de suas dívidas. Investidores da dívida norte-americana ficariam a ver navios e velhinhos não receberiam suas aposentadorias. Tentam, assim, responsabilizar os fundamentalistas de direita do Tea Party pelo impasse, diferenciando-os dos democratas, supostos reféns desse jogo. Mas será mesmo assim? Duas faces de uma mesma política Os republicanos aparecem como os grandes defensores das contas públicas, enquanto o Partido Democrata tenta encarnar uma política supostamente progressiva, preocupada com os mais pobres. Tal imagem, no entanto, longe de representar duas alternativas realmente distintas, serve mais como marketing político, criando uma ilusão de alternância de poder no sistema bipartidário. Exemplos: o governo Clinton foi marcado pelo rigor fiscal, fechando seu mandato em 2000 com um superávit de mais de 5 trilhões de dólares. O início da era Bush e sua política de intervenção e ocupação militar no Afeganistão e Iraque fizeram explodir os gastos públicos e transformaram em poucos anos o superávit em déficit. Situação agravada pelo corte nos impostos dos mais ricos. No final de seu governo, com a popularidade desgastada e diante de um país tomado pela crise econômica, anunciou um megapacote de estímulos ao sistema financeiro de 700 bilhões de dólares. Para fazê-lo aprovar no Congresso, contou com a ajuda do já presidente eleito Barack Obama que, pessoalmente, conclamou os parlamentares a aprovarem o pacote. Ou seja, o déficit público causado pelas guerras e isenções de Bush foi aprofundado com os pacotes de ajuda a Wall Street e às empresas. O déficit passou de 2,7% do PIB em 2007 para 12,7% em 2010. Já o tal da dívida foi de 62% para quase 100% hoje. Isso significa que o valor total da dívida norte-americana é o equivalente ao valor de tudo o que o país produz em um ano. Mais do que rupturas, o que se pode perceber nesses anos é uma linha de continuidade cuja a essência é o privilégio aos grandes bancos e empresas. Talvez o maior exemplo disso seja a “estatização” da então combalida General Motors, salva da falência com recursos do tesouro norte-americano. Mas se por um lado o conjunto de pacotes e estímulos ajudaram a impedir que a recessão evoluísse para uma depressão como a dos anos 1930, por outro a anêmica recuperação já vem dando sinais de esgotamento. O crescimento do primeiro trimestre deste ano foi de 1,9%, enquanto no mesmo período de 2010 foi de 2,8%. O desemprego, que havia recuado, voltou a avançar com a desaceleração. E o horizonte não é nada alentador. Crise política A falta de perspectiva de uma solução para a crise vem se transformando cada vez em uma crise política nos Estados Unidos. Por um lado amplos setores populares que se moveram durante a campanha de Obama à presidência se desiludiram com o seu governo. À permanência das tropas no Afeganistão e a demora na retirada do Iraque se juntam a continuidade da base de Guantánamo, os programas sociais limitados, como o sistema de Saúde alardeado pelo presidente e, principalmente, o alto desemprego e a economia cambaleante. Entre Wall Street, que financiou sua campanha, e os milhares de voluntários que se moveram para elegê-lo, Obama ficou com o primeiro. Ao mesmo tempo tem-se o fortalecimento do Tea Party, movimento surgido em 2009 da “América profunda” e que vocaliza o pensamento mais conservador, xenófobo e racista do país. O movimento vem ganhando força, impulsiona o Partido Republicano enquanto o empurra ainda mais à direita. Se não chega a representar de conjunto uma política econômica alternativa à atual, ajuda a radicalizar a disputa política entre democratas e republicanos e pode desatar graves crises. Foi assim que, no final de 2010, os republicanos tiveram a maioria nas eleições legislativas e conquistaram o controle da Câmara dos Representantes. Em abril deste ano o governo quase fechou em meio a um impasse entre democratas e republicanos na aprovação do Orçamento para a administração federal. E agora, caminha-se para a mais grave crise até agora e o que poderia parecer impensável há algum tempo, os EUA declararem “default”, começa a ser cogitado. O que vem a seguir É evidente que uma moratória dos EUA não interessa aos democratas e nem aos republicanos. Como estamos cansados de ver por aqui, no jogo da disputa política entre o governo e a oposição de direita, há um limite que se esbarra na defesa dos interesses da burguesia. No caso dos EUA, se trata dos interesses do Imperialismo hegemônico no planeta. Os dois lados concordam em cortar gastos, inclusive sociais. Obama colocou na roda até mesmo o Medicare (serviço público de saúde para os idosos) e o Medicaid (serviço de saúde dos mais pobres) e a Previdência Pública, medidas que aumentaram ainda mais seu desgaste com os setores que o apoiavam, principalmente as centrais, como a chapa-branca AFL-CIO. O Partido Republicano, porém, exige que nem um centavo desse ajuste venha do aumento de impostos e ameaça barrar a elevação do teto da dívida. Uma solução, porém, já começa a ser desenhada pelo próprio lado republicano. O senador Mitch McConnell propôs que o legislativo concedesse a Obama uma autorização para que ele, unilateralmente, aumente o teto do endividamento público. Assim, o país continuaria pagando suas contas e os republicanos colocariam na conta de Obama a elevação da dívida, arrastando a crise até as próximas eleições, o significado real desse impasse. De fundo, os dois lados concordam que é necessário conter o monstruoso déficit. Após a gastança desenfreada para salvar empresas e banqueiros, alguém deve pagar a conta. E tanto democratas como republicanos também concordam sobre quem deve recair esse peso: nas costas dos trabalhadores e da maioria da população.

9 de jul. de 2011

René Girard o Profano e o Sagrado

A violência e o sagrado René Girard Em Violência e o Sagrado, tradução brasileira do original La Violence et le Sacré, o antropólogo René Girard integra a sua teoria do desejo mimético anteriormente desenvolvida com seus estudos sobre o sacrifício ritual nas sociedades antigas, buscando desenvolver uma teoria compreensiva do sacrifício humano em tais sociedades. Girard inicia o livro demonstrando o duplo aspecto das vítimas expiatórias. Elas são a um só tempo tratadas como seres sagrados e criminosos. Isto é assim porque representam nestas sociedades o papel de válvula de escape dos impulsos violentos acumulados no interior da mesma. Ela é vítima substitutiva: sobre ela seus verdugos despejam todo ódio e sede de violência que carregam, aliviando-se e livrando a sociedade de possíveis conflitos. Assim, para Girard, o sacrifício ritual, presente invariavelmente em todas as culturas primitivas e antigas, mesmo na Grécia clássica, contra vítimas humanas ou animais, tem uma significação real e não meramente simbólica, pois serve para ?apaziguar as violência intestinas e impedir a explosão de conflitos.? Uma sociedade está sempre sujeita a uma escalada de violência devido ao círculo vicioso de represálias. Tal já foi observado por etnólogos em sociedades primitivas. O surgimento de uma violência incontrolável no interior de uma sociedade ocorre normalmente nos momentos da crise sacrificial, ou seja, quando os sacrifícios rituais já não mais atuam eficientemente como válvula de escape dos impulsos violentos. Para Girard os ritos sacrificias bem como os mitos que os narram simbolicamente representam a forma de uma sociedade reviver o seu acontecimento fundador, o sacrifício não mais ritual, mas real e espontâneo de uma vítima expiatória. Aqui insere-se a teoria do desejo mimético. Conforme nos conta Girard, com fortes argumentos e amplo embasamento documental, o desejo mimético ( o desejo de ter o bem do outro) é inerente à natureza humana. Os homens desejam o bem e o ser do próximo invariavelmente, o que terminará por gerar a rivalidade mimética. O detentor do bem quererá defendê-lo mas, ao mesmo tempo, estimulará o desejo do outro pois o fato de o seu bem ser também desejado por outrem potencializa o valor do mesmo. Quando um irromper com um gesto violento o outro imediatamente revidará também por impulso mimético e assim se iniciará o blood feud, um rosário interminável de represálias que somente terminará com o sacrifício de uma vítima expiatória que trará de volta a paz à sociedade. Para Girard, toda sociedade primitiva em seus primórdios experimentou o evento de uma crise de violência generalizada que ameaçava a sua própria existência e que findou com o sacrifício de uma vítima escolhida arbitrariamente sobre a qual foram despejado todos os ódios e desejos de vingança, restaurando-se a paz social e fundando-se a própria sociedade politicamente organizada. Os mitos narrariam figuradamente aqueles eventos, e dentre os mitos, Girard inclui não apenas as narrativas mitológicas, mas a tragédia grega e mesmo o Antigo Testamento. Nestes textos, Girard descobre a descrição figurada parcial ou total da rivalidade mimética, da escalada de violência e do sacrifício de vítimas expiatórias. A análise e comparação destes textos, bem como os subsídios científicos trazidos pelos estudos etnológicos e antropológicos, compõem a metodologia através da qual Girard chega às conclusões de seu trabalho. Assim Girard explica o sentido oculto de muitos dos textos das culturas primitivas e antigas: eles representam simbolicamente os horríveis eventos fundadores da sociedade que terminam no sacrifício da vítima expiatória. Os ritos sacrificiais são invariavelmente encontrados nas sociedades primitivas e antigas. É válido lembrar aqui o exemplo do pharmakós grego, um pária que era mantido cativo para ser sacrificado em épocas de grandes crises e catástrofes, mesmo naturais, como se sua morte pudesse eliminar a crise ou a catástrofe, tal como,no acontecimento fundador da sociedade, o sacrifício da primeira vítima expiatória eliminou uma grave crise de violência. O rito serve assim para manter viva a memória do acontecimento fundador e para servir como um despejo de impulsos violentos. Quando o rito já não mais desempenha a sua função, surge a crise sacrificial que é muito bem representada pelo mito de Caim e Abel. Abel sacrifica os primogênitos de seu rebanho, portanto tem uma válvula de escape. Caim já não a possui, por isso não contém seus impulsos violentes e, movido pelo desejo mimético ou inveja pelo amor que Deus tem pelo seu irmão, mata Abel. Não apenas os ritos e os mitos são explicados por Girard através de suas teorias do desejo mimético e do sacrifício, mas inúmeros costumes primitivos como o uso de máscaras, a repulsa ao sangue menstrual e aos gêmeos, e muitas das proibições ou regras de direito primitivas. A teoria de Girard, cujos dois pilares são os conceitos de desejo mimético e de sacrifício de vítimas expiatórias, constitui assim uma verdadeira teoria antropológica e sociológica geral, compreensiva de muitos fenômenos sociais e humanos. Assim, as teorias de Girard nos ajudam a compreender problemas do nosso próprio tempo tais como o racismo, o anti-semitismo ou o aborto. Afinal, a perseguição por motivos de raça ou a luta pela liberação do aborto não seriam formas de ressuscitar o velho mecanismo sacrificial, elegendo novas vítimas expiatórias de nossos ódios intestinos. Numa etapa posterior de seu trabalho, a partir da obra ?Das Coisas Ocultas desde a Fundação do Mundo?, Girard explica como o mecanismo dos sacrifícios rituais foi perdendo importância e sendo eliminado das sociedades ocidentais por força do judaísmo e do cristianismo.

29 de abr. de 2011

Requião não pode ficar mais uma vez impune!

No dia 25 de abril, o senador paranaense Roberto Requião (PMDB), protagonizou mais um episódio que revela o tipo de moral e de conduta política degradante que marcaram sua trajetória. Ao ser perguntado pelo repórter da rádio Bandeirantes, Victor Boyadjian, se abriria mão da pensão que recebe enquanto ex-governador, de R$ 24,1 mil reais, o senador roubou o gravador do jornalista e fez ameaças de agressão física contra ele. Esta atitude é reprovável e inaceitável. Não é a primeira vez que Roberto Requião se envolve neste tipo de episódio. Em 2004, agrediu o repórter do Jornal de Londrina e também lhe “arrancou” o gravador das mãos. Em outras ocasiões, ameaçou publicamente demitir trabalhadores que lutavam por melhores condições de vida, em 2009, a época governador, declarou na imprensa "Isso não é uma ameaça é um fato. Se houver greve, mando todos embora e abro rapidamente um concurso. Garanto que tem muitas pessoas querendo trabalhar". Desta vez, para tentar justificar sua conduta, o senador argumenta que há mais de 40 anos os ex-governadores do Paraná recebem esta pensão. “Estou usando essa pensão para pagar as multas que me foram injustamente impostas”, justificou. Apesar da demagogia e da “cara” popular, os dois últimos mandatos de Requião à frente do governo do Estado do Paraná favoreceram setores da burguesia que sempre financiaram suas campanhas. A reforma agrária não avançou, a maioria das promessas de melhorar as condições de trabalho dos servidores públicos não foram cumpridas, a condição dos serviços públicos (principalmente da saúde) não avançaram de acordo com as necessidades dos trabalhadores, o pedágio nas estradas não acabou e a criminalização da lutas do campo continuou. A aliança do PT com o PMDB garantiu ao primeiro partido diversos cargos no governo, em troca, a direção petista ofereceu o controle dos trabalhadores através dos sindicatos e da CUT do Paraná. Punição imediata Defendemos uma punição exemplar ao senador Roberto Requião. Este homem é um político de carreira, um burocrata do Estado, que sempre viveu e desfrutou dos privilégios do Estado. Foi deputado estadual, prefeito de Curitiba, governador por três mandatos e está no seu segundo mandato de senador federal. Requião não sabe o que é viver sem estar numa condição de poder, e se aproveita de sua condição privilegiada na sociedade, de burocrata do Estado, para oprimir trabalhadores e jornalistas. Chega de privilégios! Os trabalhadores, os cidadãos “comuns” são julgados por seus atos todos os dias, com os parlamentares e governantes não pode ser diferente. Não podemos aceitar uma atitude como esta de um parlamentar. A carreira política de Requião é a demonstração clara de como funciona o sistema eleitoral brasileiro, onde os partidos e candidatos burgueses, financiados pelos setores empresariais, investem milhões nas campanhas eleitorais para garantir a eleição de parlamentares e governantes. Quando eleitos, governam a favor da burguesia e contra os trabalhadores. Não temos nenhuma confiança nos parlamentares dos partidos burgueses, que são a ampla maioria e controlam o Congresso Nacional, não acreditamos na comissão de Ética do Senado composta por estes “senhores”, e tão pouco, no Presidente do Senado, José Sarney, que é do mesmo partido de Requião. Por isso propomos a mais ampla unidade das organizações dos trabalhadores pela cassação do mandato de Requião, a começar pelos sindicatos dos jornalistas de todo país. A impunidade contra este senador neste momento significa um ataque à liberdade de imprensa, visto que o jornalista agredido moralmente estava no exercício de sua profissão. Este não é um episódio isolado, Requião é apenas uma expressão de algo que vem se generalizando, a criminalização aos movimentos sociais tem aumentado assustadoramente no país e no mundo (como assistimos na Líbia), e tem sua expressão mais clara no caso dos treze ativistas presos e criminalizados por protestar contra o presidente norte americano Barack Obama no Rio de Janeiro. Abaixo as aposentadorias imorais aos ex-governadores A Constituição brasileira garante o “direito” à aposentadoria especial a ex-governadores. No Paraná, os ex-governadores e também as viúvas de ex-governadores, recebem um benefício de aposentadoria equivalente a R$ 24,1 mil reais por mês. Até mesmo o ex-governador Orlando Pessutti, também do PMDB, que ocupou o cargo por apenas nove meses em 2010, passou a receber o benefício especial em 2011. Estes “direitos especiais”, garantidos aos ex-governadores, revelam a natureza do Estado burguês, que garante diversos privilégios aos políticos de carreira que prestaram “bons serviços” à burguesia. Os inúmeros privilégios garantidos aos políticos e burocratas do Estado, são a garantia de uma condição social a estes senhores que nada tem haver com a vida do povo trabalhador. A verdade é que os “representantes do povo” não vivem como o povo trabalhador, e sim mais próximo do modo de vida dos ricos. Além dos privilégios, o Estado burguês é uma “fonte” inesgotável de corrupção e imoralidade. A prova categórica desta afirmação foram os aumentos salariais absurdos e imorais que os parlamentares votaram a favor deles próprios. No início deste ano, votaram aumentos de 62% para deputados e senadores, de 134% para presidente e 148% para os ministros de Estado. Os parlamentares aumentaram seus salários e o da presidente Dilma para R$ 27 mil reais, enquanto para os trabalhadores votaram um aumento pífio de apenas 6% no salário mínimo. Somos contra todos estes privilégios, que são parte da base material de toda a corrupção e imoralidade presentes no Estado burguês. Por isso defendemos o financiamento público de campanhas com igualdade para todos os partidos, direitos iguais na propaganda eleitoral e na imprensa, mandatos revogáveis a qualquer momento por iniciativa popular e salários dos parlamentares e dos membros de todas as esferas do poder público igual ao salário de um trabalhador qualificado. Abaixo as aposentadorias imorais aos ex-governadores! Defendemos a suspensão imediata das aposentadorias concedidas aos ex-governadores e as viúvas de ex-governadores de todo país, a começar pelo Paraná. Não podemos confiar nos deputados da Assembléia Legislativa do Paraná, que no dia 18 de abril, rejeitaram após votação em plenário, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que propunha acabar com a aposentadoria vitalícia na Constituição do Paraná. Todas as organizações que representam os trabalhadores precisam se unir e manifestar repúdio a concessão destas aposentadorias.

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